Vídeo novo! Sobre o capítulo "A história dos quelônios do rio Iguaçu", da autoria de Sérgio Augusto Abrahão Morato, que integra o livro "Discussões sobre Fauna", da Comfauna Livros. Inscreva-se no canal da Casa do Biólogo para não perder as novidades que estamos preparando! #biodiversidade #quelônios #fauna
terça-feira, 29 de setembro de 2020
domingo, 20 de setembro de 2020
VÍDEO NOVO: O que as borboletas comem
O que as borboletas comem
Essa é uma dúvida de muitas pessoas. Aqui você conhecerá em detalhes, os segredos sobre o que diferentes espécies de borboletas comem desde que nascem!
Quando muito jovens, ainda lagartinhas, as borboletas podem consumir partes do próprio ovo que as abrigou por alguns dias, desde que suas mães as deixaram sobre a planta certa. Mas logo ficam aptas a consumir vegetais, tornando-se vorazes enquanto crescem. Quando formam a pupa, ou crisálida, sua alimentação é interrompida. E na vida adulta, ao descobrirem o voo, ampliam a busca por novas formas de alimentação. Dizemos então, que existem duas principais fontes, néctar e frutos.
Chamamos frugívoras as borboletas que se a alimentam de frutos, em geral, já em decomposição.
E dizemos que são nectarívoras, aquelas que se alimentam do néctar das flores. Esta forma de alimentação favorece a polinização, pois as borboletas acabam transportando pólen de uma flor a outra. E, as vezes, sua boca, a espirotromba, que se desenrola para a alimentação, pode ficar congestionada de pólen.
Mas existem outras fontes nutricionais que as diferentes espécies de borboletas podem buscar.
Nutrientes do solo. Orvalho. Outros líquidos e até mesmo, seu suor. Ou fluidos de uma borboleta morta já enleada por teias de aranha... E entre as suas estranhas fontes de alimentação, estão as fezes de outros animais.
Borboletas são mesmo muito versáteis em suas fontes alimentares, recorrem a partes do seu próprio ovo, folhas, flores, frutos, líquidos, nutrientes do solo, suor humano, suas parentes e até fezes. E você, poderia se alimentar como uma borboleta?
CRÉDITOS/CREDITS
CASA DO BIÓLOGO
BIOLOGIST'S HOUSE
As imagens foram obtidas em ambiente natural.
The images where obtained in natural habitat.
MÚSICA/MUSIC:
Sneaky Business – Biz Baz Studio
IMAGENS -ROTEIRO-NARRAÇÃO/ IMAGES-NARRATION-TEXT:
MARISTELA ZAMONER
TECHNICAL CONSULTANCY:
DENI LINEU SCHWARTZ FILHO
VOCÊ GOSTOU?
CURTIR E COMPARTILHAR NOS INCENTIVA A
PRODUZIR MAIS!
DID YOU LIKE IT?
GIVING US A THUMBS UP AND SHARING
MOTIVATES US TO MAKE MORE!
terça-feira, 15 de setembro de 2020
CURSO: Abelhas – Biodiversidade e conservação
CURSO: Abelhas – Biodiversidade e conservação
O objetivo do curso “Abelhas: Diversidade e conservação” é demonstrar para a sociedade a importância e diversidade das abelhas, em especial nos ambientes urbanos, seu papel ambiental e econômico. Para tanto, serão realizadas palestras ilustradas e dialogadas, relacionadas com o seguinte conteúdo:
Módulo 1 – Biologia e diversidade das abelhas
- Data: 23/09/2020 – das 15h30 às 17h30
Conteúdo: Quem são as abelhas, como vivem, do que precisam; Diversidade de abelhas no mundo.
Módulo 2 – Importância das abelhas
- Data: 24/09/2020 – das 15h30 às 17h30
Conteúdo: Importância ambiental e econômica das abelhas; Importância das áreas naturais urbanas para a conservação das abelhas; Sugestões para aumentar a diversidade de abelhas no ambiente urbano.
Ministrante: Letícia Vanessa Graf, Bióloga, Mestre em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e atualmente cursando doutorado em Entomologia pela Universidade Federal do Paraná.
Observação: Para esta edição do curso, não haverá emissão de certificado aos participantes.
Contato para dúvidas ou sugestões: Nicholas Kaminski (coordenador do Programa Condomínio da Biodiversidade – ConBio) kaminski@spvs.org.br
Organização:
Apoio:
segunda-feira, 14 de setembro de 2020
Chalodeta theodora (C. Felder & R. Felder, 1862)
Chalodeta theodora (C. Felder & R. Felder, 1862) - Fêmea
Curitiba, Paraná - 14/09/2020
Maristela Zamoner
sábado, 5 de setembro de 2020
Jardins de borboletas e conservação
Foto: Maristela Zamoner, obtida em campo. Direitos reservados. |
Quando se pensa em um jardim de borboletas, o que vem a mente de início é: flores capazes de atrair adultos. E de fato não faltam dicas em revistas, blogs, vídeos e outras mídias sobre quais plantas cultivar para este fim.
Em geral o foco dos jardins de borboletas é este. Entretanto, conceber um jardim para borboletas pode ter diferentes objetivos:
1. Observação de adultos se alimentando em flores.
2. Observação de adultos em diferentes fontes alimentares como flores, frutos, líquidos, fezes e outros.
3. Observação de um ou mais ciclos de vida de borboletas.
4. Conservação de borboletas e natureza.
Estes objetivos foram colocados em um grau crescente de complexidade. Todos são válidos, mas diferem em sua essência e em seu papel perante o cuidado mais profundo com a natureza.
Jardins feitos para observação de adultos não precisam ter a preocupação com plantas nativas ou exóticas ou com áreas de conservação. Podem ser concebidos apenas com dois critérios: espécies vegetais que atraiam adultos e estética. E mesmo estes jardins, podem ser criados com uma composição florística capaz de atrair maior ou menor variedade de borboletas.
Quando se almeja com um jardim a atração de guildas diferentes de borboletas adultas para alimentação, nectarívoras e frugívoras, além das flores é necessário prever espaços para oferta de frutas ou atrativos feitos delas.
Já os jardins que, independente de visarem atrair ou não adultos para alimentação, almejam favorecer a observação de ciclos de vida completos, são um pouco mais especializados. Nestes casos é aconselhável um estudo prévio das espécies de borboletas e das plantas hospedeiras que ocorrem no local, para manejar o cultivo dos vegetais adequados a fim de favorecer a observação de oviposições e fases larvais.
No nível mais elaborado de criação de um jardim de borboletas temos o desejável objetivo de conservação. Neste caso é necessário que parte do ambiente definido para o jardim seja destinado a preservação de vegetação nativa – que muitos chamam de mato, mesmo que seja reconstituído. Também é possível conceber um jardim dessa natureza adjacente a áreas de preservação. Neste caso, as áreas preservadas serão o sustentáculo vegetal de espécies de borboletas que poderão ser observadas se alimentando em fases adultas nas flores plantadas para este fim e também se reproduzindo em diferentes plantas nativas. Este tipo de jardim tem potencial inclusive para prática mais profunda de ciência cidadã ou mesmo pesquisa científica. Entretanto, é preciso quebrar paradigmas para desejar um jardim assim, pois a ideia corrente é que, de modo geral, mato precisa ser roçado.
Na sequência veja diferentes espaços que um jardim de borboletas com objetivo de conservação pode comportar:
- Espaços de alimentação de adultos:
· Com flores atrativas, preferencialmente de ocorrência local;
· Com frutos ou compostos deles feitos;
· Com sais, como nos areais úmidos onde são observados os panapanás, nos quais muitas borboletas se reúnem;
· Com líquidos e fezes de aves e outros animais.
- Espaços de alimentação de fases jovens:
· Com plantas hospedeiras de ocorrência no local, plantadas para este fim.
O planejamento em relação a presença de aves e outros animais é muito importante, pois a presença de suas fezes pode ser conveniente para complementação nutricional de borboletas adultas. Então é interessante conhecer previamente as espécies locais de aves, de outros animais e a natureza de suas interações com as borboletas. A partir deste conhecimento avalia-se a escolha de atrativos voltados para aquelas aves, ou aqueles animais, que não sejam predadores e ao mesmo tempo possam enriquecer o ambiente com suas fezes.
Existem muitas formas de compatibilizar a estética com objetivos de conservação, que o planeta tanto precisa, já que nossas áreas naturais estão tão impactadas e continuam sendo reduzidas. Jardins concebidos para preservar parte da vegetação nativa não precisam, por isto, perder em estética, precisam sim de pensamentos inovadores, comprometimento com a proteção da natureza e criatividade.
Às vezes, simplesmente administrar roçadas mais parcimoniosas em determinados locais pode fazer este papel. E quando pensamos em escala, muitos jardins neste perfil sendo providenciados pelas pessoas em suas casas, começamos a imaginar resultados surpreendentes para a conservação, que vão bem além das borboletas, avançando para proteção e, ou, recuperação de seus ambientes.
A criatividade e o objetivo de quem cria um jardim de borboletas é o que define sua beleza e seu papel potencial para conservação, que nosso planeta tanto precisa.
Metodologia fotográfica, transparência e ciência cidadã
Foto: Maristela Zamoner. Borboleta da espécie Agraulis vanillae maculosa ovipositando em planta da espécie Passiflora lepidota. |
Os estudos que viabilizaram descobertas como esta da raríssima Passiflora lepidota (confira AQUI), foram estruturados de maneira inovadora, apoiados em novas tecnologias que permitiram uma transparência inédita, pois os dados brutos, ou seja, as fotografias e seus metadados, tiveram disponibilização integral ao público, e no próprio ritmo de desenvolvimento do estudo. No caso dos estudos propostos, foram literalmente milhares de registros, diretamente apresentados por meio de plataforma de ciência cidadã, a qualquer interessado no mundo (confira AQUI). Nenhum exemplar precisou ser morto para obtenção de resultados indiscutivelmente relevantes.
Essa transparência que as novas tecnologias permitem, oportunizam a todo especialista do mundo, que tenha interesse nos grupos registrados e compartilhe da visão das metodologias não destrutivas e participativas, se integrar abertamente ao processo. Este é um diferencial atípico para os padrões tradicionais de produção de conhecimento na área. Portanto, seus caminhos também são inovadores.
Quando trabalhamos com métodos tradicionais, pelos quais os dados brutos não são disponibilizados publicamente, a resolução das identificações de espécies fica dependente, exclusivamente, de quem tem acesso às informações coletadas ou, como em muitos casos, aos exemplares que foram retirados do ambiente, sacrificados e armazenados em coleções científicas não abertas ao público em geral. Desta forma, não há como um especialista interessado tomar conhecimento desse conteúdo, se não sendo pessoalmente contatado. E por consequência, também não há como se checar o processo das identificações destes especialistas publicamente.
Estudos abertos, que dão publicidade integral de seus conteúdos e dos debates em torno de suas identificações, invertem esta lógica uma vez que envolvem milhares de registros permitindo a livre participação de todos os interessados, inclusive especialistas, por meio das práticas que se integram a caminhada da ciência cidadã. Registros de biodiversidade disponibilizados a público, estão disponíveis como fonte bibliográfica a ser consultada.
Foto: Maristela Zamoner, obtida em campo. Direitos reservados. A espécie da borboleta é Arzecla straelena. |
O caso da Arzecla straelena, detalhadamente discutido no livro Discussões sobre fauna (Schwartz, Morato e Zamoner, 2020) mostra bem os benefícios e avanços trazidos por estudos inovadores que dão publicidade integral dos dados brutos do estudo.
A publicidade de uma quantidade de dados enorme permitiu a um especialista de outro continente, que tem interesse no grupo e nesta metodologia inovadora, entendendo seus valores e potenciais, checar identificações de registros do gênero Arzecla, demonstrando a necessidade de ajustar suas identificações. Este caso mostra claramente a inversão da lógica tradicional viabilizada pela transparência.
Perde o sentido que especialistas sem interesse nestes métodos inovadores, as vezes em situação de conflito de interesses, sejam pessoalmente convidados a se manifestar frente a uma quantidade tão grande de registros. Isto acaba sendo otimizado apenas para casos isolados, contatos de confirmação, depois de aberta publicamente a discussão justificada do reconhecimento taxonômico. Foi o que ocorreu com a confirmação da espécie Arzecla straelena feita pelo seu próprio descritor que, generosamente, explicou em detalhes a razão do reconhecimento da espécie, admitindo inclusive sua distribuição geográfica mais ampla. Mudanças de paradigmas advindas de novas tecnologias exigem também soluções e metodologias inovadoras.
Foto: Maristela Zamoner. Obtida em campo. Direitos reservados. Espécie de borboleta não descrita, pertencente ao gênero Splendeuptychia. |
Um outro registro realizado por meio destas tecnologias inovadoras merece discussão. O registro foi realizado em uma área adquirida há cerca de três décadas pelo proprietário, na qual existia apenas uma plantação de milho. O proprietário replantou espécies da Mata Atlântica recuperando aspectos originais e já conta, por exemplo, com araucárias em reprodução. Neste local corre um estudo de borboletas por metodologia inovadora, não destrutiva, apoiada em fotografias e novas tecnologias.
Um dos seus registros é particularmente importante. Uma borboleta do gênero Splendeuptichia foi registrada no local, disponibilizada em plataforma de ciência cidadã e nela recebeu a contribuição do especialista Keith Willmott, do Museu da Flórida, que informou se tratar de uma espécie não descrita.
Neste momento surge o contraponto tradicional do questionamento sobre a inviabilidade da descrição de uma espécie registrada apenas em fotografia.
Esta questão foi brevemente discutida no livro Lepidopterologia, novas perspectivas em pesquisa e conservação (Schwartz e Zamoner, 2018), informando que o International Code of Zoological Nomenclature já admite descrição de novas espécies da fauna a partir de registro fotográfico. E entendemos que este tipo de atividade mereça evoluir tecnicamente, acontecendo de forma mais ampla e intensa.
Considerando as continuadas reduções de áreas naturais e a possibilidade de coletas destas espécies tão raras se configurarem como mais uma pressão negativa para esta fauna, é cabível começar a viabilizar mais amplamente as descrições de espécies por fotografias.
Precisamos avançar urgentemente além das metodologias tradicionais restritas a coletas, sacrifícios e armazenamentos de borboletas. É tempo de deixar as coletas e sacrifícios para casos nos quais ainda são insubstituíveis, e sempre buscando mais avanços na direção de métodos não destrutivos.
Mas o quadro todo que envolve as coletas e coleções cientificas é muito mais complexo do que parece e este caso pode ser ainda mais ilustrativo do que já é para o questionamento das descrições de espécies por fotografias.
Relembrando, temos uma espécie não descrita registrada viva em fotografia e um especialista que informa ser sua ocorrência conhecida para os estados de São Paulo e Paraná. Portanto, a maior probabilidade é que mais de um exemplar desta espécie já tenha sido coletado, sacrificado e armazenado em uma ou mais coleções científicas. Como esses acervos não foram democratizados, a população fica impossibilitada de comparar livremente o registro fotográfico a exemplares já coletados, independentemente de estarem ou não descritos. É necessário aguardar que alguém a descreva e democratize imagens dos indivíduos coletados. E, como muitos outros, estes exemplares devem jazer aguardando que suas mortes se justifiquem pelo menos através de sua descrição. Esperamos que isto ocorra antes de se tornarem cinzas em mais um incêndio, como o irreparável ocorrido com o acervo extraordinário de lepidópteros que existia no Museu Nacional em 2018.
Quando pretendemos uma postura cientificamente honesta e comprometida efetivamente com a conservação da natureza, precisamos avaliar parcimoniosamente as possibilidades.
Ao planejar a metodologia de estudo para uma área, a pergunta honesta a se fazer é:
Enfrentamento de uma pandemia, apesar da caminhada científica tradicional
Foto: Maristela Zamoner, obtida em campo. Borboleta da espécie Erora tella, direitos reservados. |
Somemos a esta anedota ilustrativa e de cunho didático da postagem anterior, a realidade.
Em 2020 os autores Kwan Hoong Ng e Eva Bezak publicaram o artigo Prejudice in science – Lessons from the coronavirus story, em um periódico da área médica, que vale a pena ser lido, para entender como o funcionamento dos caminhos tradicionais pode prejudicar o processo pelo qual a sociedade tem o direito de escolher sobre o uso ou não de novas tecnologias. O artigo fala da falha no processo científico ao avaliar duas descobertas que se revelaram com o tempo importantíssimas, em especial, agora durante o enfrentamento da pandemia de COVID-19. Uma delas foi a técnica de PCR e a outra, a identificação microscópica do coronavírus.
Em 1993 Kary B. Mullis recebeu o Prêmio Nobel de Química por seu trabalho sobre a reação em cadeia da polimerase, conhecida como PCR, tecnologia que revolucionou a sociedade. Esta técnica permitiu avanços incalculáveis na biologia e na medicina, é utilizada, por exemplo, na identificação de doenças genéticas, diagnósticos de muitas outras enfermidades, em estudos de filogenia, reconhecimentos de paternidade, na medicina forense e muitas outras áreas. A criação de Mullis revolucionou a biologia molecular, mas as maiores autoridades científicas contemporâneas recusaram o artigo científico redigido pelo autor para sua publicação. Sim, o artigo original desta tecnologia revolucionária que tanto tem beneficiado a sociedade foi recusado pelas maiores revistas científicas do mundo, Nature e Science. O estudo acabou sendo publicado em um periódico secundário. Entretanto, seu impacto para a sociedade não se compara ao da maioria dos artigos publicados por estas revistas consideradas como as mais impactantes para a ciência.
Outro caso citado pelos autores é o da técnica June Almeida, uma escocesa que nunca teve acesso à academia, mas adquiriu habilidade incomum em microscopia eletrônica, chegando a desenvolver técnicas inovadoras. E foi isto que a permitiu ser pioneira no reconhecimento de um novo tipo de vírus, o coronavírus, em 1964. Mas seu artigo foi desprezado pelos revisores sob a justificativa de trazer fotos de um vírus de gripe com qualidade ruim. Acabou conseguindo publicar apenas em 1968, obtendo menos de duas centenas de citações. Entretanto, hoje sua técnica ainda é usada por pesquisadores para obter rapidamente imagens precisas que permitem identificação de vírus. Foi esta a jornada que permitiu o conhecimento desse vírus causador de tamanha pandemia que enfrentamos hoje.
Os autores afirmam no artigo que o preconceito e quem sabe até a ignorância estão integrados ao funcionamento da sociedade e a pesquisa científica não fica de fora disto. Para os autores, é necessário manter a mente aberta uma vez que novas descobertas, mesmo perturbadoras, podem trazer avanços inesperados.
O drone do professor João
Foto: Maristela Zamoner. Obtida em campo. Blepolenis bassus. Direitos reservados. |
Quando uma nova tecnologia é criada e tem potencial de beneficiar o meio ambiente e a sociedade, ou ser por ela preferida, as parcerias que dela virão a fim de garantir o acesso da população, precisam se estabelecer em relações livres de conflito de interesse. Esta independência é indispensável quando pretendemos que a sociedade tenha a oportunidade de exercer o direito de conhecer e decidir o que prefere em questões que envolvem novas tecnologias, evolução metodológica e conservação ambiental.
Para compreender o que isto significa vejamos o exemplo hipotético, meramente ilustrativo e ficcional que segue.
Suponhamos que o João, um cabeleireiro e professor da área, tenha criado um drone de baixíssimo custo, pequeno, que pode ser adquirido por qualquer pessoa para cortar cabelos em casa, por tempo indefinido, conferindo autonomia ao cidadão que a quiser, conforme programação estética a gosto do usuário e ainda liberando oxigênio no ar durante seu funcionamento, contribuindo para o controle do efeito estufa.
Neste mundo ficcional, as maiores autoridades em corte de cabelo estão nas escolas de cabeleireiros, nas sociedades de barbeiros e similares. São entidades que de alguma forma subsistem economicamente dependentes do ensino ou da reunião de pessoas que vivem da atividade de cortar cabelos. Logo, será conflituoso apoiarem uma nova tecnologia que reduza a necessidade de formar tantos cabeleireiros por dar autonomia ao cidadão para que realize por conta esta atividade, ao fazer uso livre de uma nova tecnologia que o torna independente. É natural compreender que estas pessoas podem se sentir ameaçadas pela nova tecnologia do professor João. Não é difícil imaginar que neste caso haverá uma boa possibilidade de fazerem o que está ao seu alcance, para desqualificar o produto e talvez até mesmo seu criador. E podem ter audiência das pessoas que creem na sua autoridade superior no assunto. Por isto, se o professor João quiser viabilizar para a sociedade o direito de escolher se quer ou não o benefício tecnológico que desenvolveu para o cidadão e para o meio ambiente, terá sucesso buscando parceiras nas pessoas que querem cortar seus cabelos com autonomia e contribuindo com o meio ambiente, e não nas maiores autoridades estabelecidas em corte de cabelo.
Com isto dizemos que, neste caso hipotético, como em muitos outros não hipotéticos, as autoridades que estão na situação de alguma dependência financeira ou qualquer outra de algo que se pode demonstrar menos necessário, passam a ter sua opinião, sobre este algo, potencialmente suspeita por conflito de interesse. Neste caso, claramente as autoridades não estão em posição isenta para opinar sobre a nova tecnologia. Logo, não se encontram na plenitude do julgamento e nem do questionamento da tecnologia proposta pelo professor João.
Por isto, o professor João terá que criar caminhos novos para que a sociedade e o meio ambiente recebam os benefícios de sua tecnologia, e isto precisará ocorrer independente das autoridades estabelecidas há séculos na área, que estão eticamente impedidas de se pronunciar de maneira isenta pelo conflito de interesses no qual estão imersas.
Estudos de borboletas como subsídio para gestão, uma reflexão
Não é raro que estudos envolvendo borboletas, realizados para subsidiar a gestão de áreas protegidas ou mesmo de empreendimentos e/ou seus licenciamentos, sejam procedidos com amostragens apenas de exemplares adultos coletados, e a intervalos de tempo demasiadamente longos, como a cada seis ou quatro meses.
Estudos desta natureza, baseados apenas na constatação de borboletas adultas em dado local, têm potencial de trazer resultados que se distanciam do significado real do ambiente para as comunidades de borboletas, que são bioindicadoras, consecutindo em subsídios falhos para gestão.
Para exemplificar, imaginemos uma situação hipotética extrema para facilitar a compreensão.
Nesta situação hipotética, fictícia, existem duas áreas que serão estudadas a fim de subsidiar a decisão sobre qual delas será utilizada para a instalação de um empreendimento, sendo, portanto, suprimida, e qual será cedida para atividades voltadas à conservação. Este estudo será procedido apenas com a avaliação de borboletas adultas constatadas em cada uma das duas áreas, que se encontram adjacentes uma em relação a outra.
Na primeira área existem plantações de vegetais do gênero Lantana e jasmins. Na segunda área há um terreno tomado por mato que nunca foi utilizado, contido por um muro e, portanto, que não apresenta bordas com composição muito diferenciada. Ambas as áreas são do mesmo tamanho.
Foi procedido um estudo durante um ano nas duas áreas. Na primeira área coletaram-se 200 espécies de borboletas. Na segunda, de mato, 100 espécies. Com estes dados o gestor decidiu ceder a primeira área, o mato, para empreendimento que o suprimiu, e a segunda área, que segundo o estudo apresentou maior biodiversidade, para atividades de conservação. Mas em pouco tempo os quantitativos de espécies de borboletas reduziram muito na segunda área.
Em nenhuma destas áreas foi avaliada a capacidade do ambiente de suportar os ciclos de vida das borboletas, tipo de avaliação incomum.
A falta deste tipo de avaliação pode comprometer os resultados quando o objetivo é subsidiar ações de gestão. Pois há uma boa probabilidade, no caso, de ser a área de mato o sustentáculo de muitos dos ciclos das espécies de borboletas coletadas na área com plantação de flores. Ao suprimir o mato, as borboletas da primeira área, de flores, foram reduzidas, pois não tinham mais onde se reproduzir.
FOTO: Maristela Zamoner. Obtida em campo. Direitos reservados. Proibida a cópia não autorizada. Ovo de borboleta da espécie Heliconius ethilla narcaea. |
Já os estudos que envolvem ciclos de vida de borboletas acompanhados em campo, com imersão ou imersão parcial do pesquisador, têm potencial de contribuir efetivamente com a consistência dos resultados. Estudos assim revelam onde está o sustentáculo dos ciclos de vida das espécies constatadas e não apenas onde adultos se alimentam. Isto passa por verificar dados de atividades ecológicas em campo.
Estudos mais profundos, merecem ser considerados quando o objetivo é subsidiar ações de gestão, a fim de evitar decisões potencialmente desastrosas, fortalecendo ações consistentes que de fato coadunem com objetivos conservacionistas.