Seguidores

sábado, 5 de setembro de 2020

Enfrentamento de uma pandemia, apesar da caminhada científica tradicional


Foto: Maristela Zamoner, obtida em campo. Borboleta da espécie Erora tella, direitos reservados.



Somemos a esta anedota ilustrativa e de cunho didático da postagem anterior, a realidade. 

Em 2020 os autores Kwan Hoong Ng e Eva Bezak publicaram o artigo Prejudice in science – Lessons from the coronavirus story, em um periódico da área médica, que vale a pena ser lido, para entender como o funcionamento dos caminhos tradicionais pode prejudicar o processo pelo qual a sociedade tem o direito de escolher sobre o uso ou não de novas tecnologias. O artigo fala da falha no processo científico ao avaliar duas descobertas que se revelaram com o tempo importantíssimas, em especial, agora durante o enfrentamento da pandemia de COVID-19. Uma delas foi a técnica de PCR e a outra, a identificação microscópica do coronavírus.

Em 1993 Kary B. Mullis recebeu o Prêmio Nobel de Química por seu trabalho sobre a reação em cadeia da polimerase, conhecida como PCR, tecnologia que revolucionou a sociedade. Esta técnica permitiu avanços incalculáveis na biologia e na medicina, é utilizada, por exemplo, na identificação de doenças genéticas, diagnósticos de muitas outras enfermidades, em estudos de filogenia, reconhecimentos de paternidade, na medicina forense e muitas outras áreas. A criação de Mullis revolucionou a biologia molecular, mas as maiores autoridades científicas contemporâneas recusaram o artigo científico redigido pelo autor para sua publicação. Sim, o artigo original desta tecnologia revolucionária que tanto tem beneficiado a sociedade foi recusado pelas maiores revistas científicas do mundo, Nature e Science. O estudo acabou sendo publicado em um periódico secundário. Entretanto, seu impacto para a sociedade não se compara ao da maioria dos artigos publicados por estas revistas consideradas como as mais impactantes para a ciência. 

Outro caso citado pelos autores é o da técnica June Almeida, uma escocesa que nunca teve acesso à academia, mas adquiriu habilidade incomum em microscopia eletrônica, chegando a desenvolver técnicas inovadoras. E foi isto que a permitiu ser pioneira no reconhecimento de um novo tipo de vírus, o coronavírus, em 1964. Mas seu artigo foi desprezado pelos revisores sob a justificativa de trazer fotos de um vírus de gripe com qualidade ruim. Acabou conseguindo publicar apenas em 1968, obtendo menos de duas centenas de citações. Entretanto, hoje sua técnica ainda é usada por pesquisadores para obter rapidamente imagens precisas que permitem identificação de vírus. Foi esta a jornada que permitiu o conhecimento desse vírus causador de tamanha pandemia que enfrentamos hoje.

Os autores afirmam no artigo que o preconceito e quem sabe até a ignorância estão integrados ao funcionamento da sociedade e a pesquisa científica não fica de fora disto. Para os autores, é necessário manter a mente aberta uma vez que novas descobertas, mesmo perturbadoras, podem trazer avanços inesperados. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário