Seguidores

sábado, 5 de setembro de 2020

Estudos de borboletas como subsídio para gestão, uma reflexão

Não é raro que estudos envolvendo borboletas, realizados para subsidiar a gestão de áreas protegidas ou mesmo de empreendimentos e/ou seus licenciamentos, sejam procedidos com amostragens apenas de exemplares adultos coletados, e a intervalos de tempo demasiadamente longos, como a cada seis ou quatro meses.

Estudos desta natureza, baseados apenas na constatação de borboletas adultas em dado local, têm potencial de trazer resultados que se distanciam do significado real do ambiente para as comunidades de borboletas, que são bioindicadoras, consecutindo em subsídios falhos para gestão. 

Para exemplificar, imaginemos uma situação hipotética extrema para facilitar a compreensão.

Nesta situação hipotética, fictícia, existem duas áreas que serão estudadas a fim de subsidiar a decisão sobre qual delas será utilizada para a instalação de um empreendimento, sendo, portanto, suprimida, e qual será cedida para atividades voltadas à conservação. Este estudo será procedido apenas com a avaliação de borboletas adultas constatadas em cada uma das duas áreas, que se encontram adjacentes uma em relação a outra.

Na primeira área existem plantações de vegetais do gênero Lantana e jasmins. Na segunda área há um terreno tomado por mato que nunca foi utilizado, contido por um muro e, portanto, que não apresenta bordas com composição muito diferenciada. Ambas as áreas são do mesmo tamanho.

Foi procedido um estudo durante um ano nas duas áreas. Na primeira área coletaram-se 200 espécies de borboletas. Na segunda, de mato, 100 espécies. Com estes dados o gestor decidiu ceder a primeira área, o mato, para empreendimento que o suprimiu, e a segunda área, que segundo o estudo apresentou maior biodiversidade, para atividades de conservação. Mas em pouco tempo os quantitativos de espécies de borboletas reduziram muito na segunda área.

Em nenhuma destas áreas foi avaliada a capacidade do ambiente de suportar os ciclos de vida das borboletas, tipo de avaliação incomum. 

A falta deste tipo de avaliação pode comprometer os resultados quando o objetivo é subsidiar ações de gestão. Pois há uma boa probabilidade, no caso, de ser a área de mato o sustentáculo de muitos dos ciclos das espécies de borboletas coletadas na área com plantação de flores. Ao suprimir o mato, as borboletas da primeira área, de flores, foram reduzidas, pois não tinham mais onde se reproduzir.


FOTO: Maristela Zamoner. Obtida em campo. Direitos reservados. Proibida a cópia não autorizada.
FOTO: Maristela Zamoner. Obtida em campo. Direitos reservados. Proibida a cópia não autorizada. Ovo de borboleta da espécie Heliconius ethilla narcaea.


Já os estudos que envolvem ciclos de vida de borboletas acompanhados em campo, com imersão ou imersão parcial do pesquisador, têm potencial de contribuir efetivamente com a consistência dos resultados. Estudos assim revelam onde está o sustentáculo dos ciclos de vida das espécies constatadas e não apenas onde adultos se alimentam. Isto passa por verificar dados de atividades ecológicas em campo.  

Estudos mais profundos, merecem ser considerados quando o objetivo é subsidiar ações de gestão, a fim de evitar decisões potencialmente desastrosas, fortalecendo ações consistentes que de fato coadunem com objetivos conservacionistas.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário